O medo acompanha a humanidade. Medo do novo, da incerteza, de romper a barreira do espaço e desbravar o infinito.
Sem dados e evidências, o medo prevalece e ficamos inertes aos achismos de outrem. Com medo, não seríamos bandeirantes da galáxia. Acabar com o medo nos move para a frente. A humanidade precisa de seus primeiros passos.
Durante 2020 o medo era virar uma estatística do jornal da noite.
As vacinas surgiram e aqui chegaram a burro de carga, mas chegaram. A esperança soprou. Mas apenas para ser engolida pelo medo do momento - a reinfecção.
O coronavírus instaurou a pandemia e o pandemônio. Pior dos cenários.
Disputas pró e contra, aquilo e aquele, medo e medo.
Acalmem-se.
A reinfecção chegou. Fincou bandeira. É fato, notícia, real news. Mas longe de ser o fim do mundo. Teorias da conspiração afloram a cada tweet, enuviando as evidências científicas. Atenham-se às evidências, temos que ir em frente.
Na Dinamarca, de 11 mil infectados na primeira onda do país, apenas 0,65% apresentaram um novo PCR positivo na 2ª onda, no final de 2020.
De 8 mil profissionais de saúde do Reino Unido com COVID confirmado, 99% não apresentaram reinfecção que causasse qualquer sintoma, inclusive com proteção contra a variante local B.1.1.7.
No Qatar, de 43 mil pessoas com sorologia positiva, o único caso grave de reinfecção nem intubado foi. Nenhum óbito. Zero.
Acalmem-se.
No Brasil, de confirmados não temos nem os dedos das mãos. Confirmação depende da análise genética viral. Processo trabalhoso e amiúde inviável por material insuficiente. Por isso, a reinfecção verdadeira dá espaço à presumida, baseada na suspeição médica, mas sem comprovação genética oficial. São casos que eu vi e outros que seu médico também dirá ter visto.
Mas não acredite em cifras muito maiores do que as dos estudos. Atualmente a reinfecção sintomática não chega a 1%.
Passada a pandemia − sim, ela vai acabar! −, o coronavírus com suas mutações e variantes caminha para ser um vírus endêmico como o influenza da gripe, que causa surtos eventuais e tem formas tão graves quanto o SARS-CoV-2; e todo ano milhões recebem vacinas “atualizadas” para prevenir o pior.
A imunidade pós-infecção se evanesce com o tempo, mas segundo os estudos perdura por além dos seis meses, em umas pessoas mais do que em outras. Casos muito leves e assintomáticos são os que criam uma resposta imune mais branda e menos longeva. A vacinação continua fundamental.
Mas também não vamos erradicar o vírus com ela. Esqueçam.
Em 1000 anos de origem da medicina moderna, 400 da criação do microscópio, 100 do descobrimento do primeiro vírus e 70 do único prêmio Nobel para uma vacina, só uma doença infecciosa em humanos foi erradicada: a varíola.
Uma doença sem reservatórios animais e sem infectados assintomáticos que transmitem silenciosamente.
A COVID-19 não é a varíola, veio para ficar. Fincou a bandeira da reinfecção.
O último caso de varíola na América do Sul foi no Rio de Janeiro, em 1971 nesse mesmo mês de abril.
50 anos.
Dois anos antes, a Apollo 11 alcançava o inimaginável, hoje os EUA dão seu segundo salto para a humanidade, com 25% da população plenamente vacinada.
Nós engatinhamos.
Mas deem tempo, também vamos aprender a andar.
Não acreditem nos exageros conspiratórios. A reinfecção fincou bandeira sim, mas não uma imponente e tremulante; que ela se torne uma bandeira lunar, esquecida, distante, quase agravitacional.
O homem pisou mesmo na Lua?
Bernardo Harboe é Clínico Geral e Cardiologista
Cofundador da CLÍNICA VH MED
Parabéns, Bernardo, seu texto me tocou profundamente! Direto, conciso e verdadeiro. Me acalmou, me deu esperança por dias melhores num futuro nem tão distante. Um abraço afetuoso , cheio de orgulho por seu trabalho e talento. Tia